Não me lembro mais

Hoje, levantei cedo com o som do celular tocando. Depois olhei em volta da casa e lá estava eu sozinho denovo.
Minhas antigas amizades se dissolvem como bolhas de sabão. Esqueci nomes. Mal consigo lembrar os olhos de quem já passou por minha vida. O passado diluiu momentos que poderiam torná-los familiares. Fiz-me irmão, doei-me inteiramente a companheiros, recebi carinho quando precisei e me consederam o ombro quando chorei. Segura firme minha mão, abraça-me com vontade, tive amigos que isso me fizeram, mas hoje hesito. Desconfiado, reparto pedaços do coração. Não suporto imaginar a dor de outras separações, de mais decepções.

Tenho medo de abrir os porões da alma. A desarrumação de minha casa faz sentido para mim. O que os outros consideram bagunça, tem uma sincronicidade própria, que me deixa em paz. Vacilo em rasgar os envelopes selados, onde escondo segredos. Sei detectar os traumas que me deixaram relachado e desinteressado, os complexos que me deram olhos desconfiados, as circunstâncias que me fizeram viver à beira do pranto, as fragilidades que me transformaram em tímido. Mas não pretendo explicar nada a ninguém.
Tornei-me cauteloso quando brinco e dou risadas. Fujo dos que procuram analisar a minha felicidade; ela não carece de julgamentos. O riso que meus lábios desenham não tem que ser explicado. Incorporo a alegria para que não seja pisoteada como a pérola deixada na rua. Prezo em não deixar vazar frágeis pensamentos; a pouca riqueza que tenho merece ser guardada debaixo de mil segredos.
Olho para colegas e antecipo navalhadas. Resguardo as costas dos estiletes da inveja. Assusto-me. As maldades que já sofri são parecidas com as que eu próprio já aconcheguei no peito. Se não sei explicar o porquê de atitudes mesquinhas em mim, também não justifico a suspeita que observo no próximo. Não sou pior nem melhor que os demais. Por isso, cerco o quintal de  casa contra lobos ferozes. Sempre espero alguém ávido para destruir o pedacinho da dignidade que me resta.
Meus desanimos não serão rasos. Desço às regiões profunda da angústia. Envolvo-me na absoluta escuridão da alma; que o lençol do desgosto me isole. Quero ficar na quarentena dos tristes. E provar a verdade de que “são bem-aventurados os que choram, porque serão consolados”.


Comentários

  1. Oi Re

    Mesmo na dor é preciso buscar a alegria.

    Beijos

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  2. obrigada meninas, é bom vê-las por aqui

    bjus

    Re

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  3. oi Re, que texto lindo não?
    Parece que tem um tiquinho da gente dentro dele?
    Parabéns ao autor e a você por postar, nos permitindo assim apreciá-lo
    beijos, beijinhos e beijocas!!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Janna querida, que satisfação tê-la aqui em modesto blog,obrigada por participar...
      um big bju

      com carinho
      Re

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